ADI 7.011 e exigência de publicação de atos societários em diários oficiais
ADI 7.011 e exigência de publicação de atos societários em diários oficiais

ADI 7.011 e exigência de publicação de atos societários em diários oficiais

As sociedades anônimas são amplamente conhecidas e utilizadas em operações que congregam interesses distintos, o que gera a necessidade que esse tipo societário tenha um alto grau de confiabilidade das informações para que todos os stakeholders envolvidos na cadeia possam desempenhar suas funções seguramente, sem que suas atitudes sejam tomadas em meio a um cenário de assimetria informacional.

Diante desse contexto, o legislador brasileiro tomou como princípio norteador a publicidade dos atos societários realizados no âmbito das sociedades anônimas, dada a necessidade de acesso às informações por seus acionistas e, por muitas vezes, da própria sociedade civil, podendo ser percebido tal posicionamento nos artigos 94 e 271 da Lei nº 6.404/1976 (LSA).

Seguindo o ensinamento de Sergio Campinho, “A adequação dos mecanismos de publicidade, garantindo-lhes eficiência e idoneidade, assegura os interesses dos acionistas minoritários e do mercado de capitais, interesses esses expressamente tutelados por diversas leis societárias” [1].

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Descrição gerada automaticamente com confiança baixa

Para tanto, disciplinou-se no artigo 289 da LSA a forma de publicação dos atos a fim de alcançar a finalidade contida na norma. Até o ano de 2019, a regra era a necessidade de publicação dos atos societários exigidos pela lei no órgão oficial do ente federativo em que estivesse estabelecida a sede da companhia, juntamente com a publicação em um jornal de grande circulação na mesma localidade.

No entanto, a modalidade adotada pela lei, que tinha o seu fundamento calcado no contexto da sua edição ocorrida na metade da década de 1970, acabou tornando-se obsoleta em razão da alteração dos meios de comunicação comumente utilizados na sociedade, bem como diante dos custos de publicação de extensos atos em veículos de comunicação que cobravam por espaço utilizado em seus periódicos.

Nessa esteira, o governo federal editou a Medida Provisória nº 892/2019 buscando desburocratizar e desonerar as publicações obrigatórias para as sociedades anônimas, determinando, com isso, que elas somente deveriam ser realizadas no sítio eletrônico da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e da entidade administradora do mercado em que os papéis da companhia são negociados.

Em razão da ausência de apreciação pelo Congresso Nacional no prazo legal, a MP caducou, perdendo, assim, os seus efeitos. Após isso, o legislativo federal apreciou e aprovou um projeto de lei sobre a matéria que se tornou a Lei nº 13.818/2019, entrando em vigor a partir do dia 01 de janeiro de 2022.

Com essa norma, alterou-se o artigo 289 da LSA para modificar a forma de publicação dos atos societários, definindo que as publicações, em regra, deverão ser realizadas de forma resumida em jornais de grande circulação da sede da sociedade, conjuntamente com a divulgação na íntegra no sítio eletrônico do mesmo jornal.

Naquilo que concerne especificamente às demonstrações financeiras, determinou-se que a sua forma resumida deverá contar com, pelo menos, 1) a informação dos dados comparativos com o exercício anterior, 2) informações ou valores referentes a cada grupo, 3) a classificação de contas ou registros e 4) extrato de registros relevantes definidas nas notas explicativas e nos pareceres dos auditores independentes.

Nesse cenário, a Associação Brasileira de Imprensas Oficiais (Abio) protocolou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 7.011/DF, no dia 08 de outubro de 2021, arguindo a falta de compatibilidade das alterações introduzidas pela Lei nº 13.818/2019 na LSA com os preceitos consolidados pela Carta Magna brasileira.

Em sua argumentação, a ABIO afirma que a modificação da LSA desrespeitou a Constituição da República (CRFB/1988) a partir da inobservância do direito à informação, consagrado nos artigos 5º, IX, XIV e 220 da CRFB/1988, considerando, dentre outros pontos, que “informações de notável interesse público passarão a ter sua circulação e divulgação reguladas não por normas de Poder Público, mas por opções comerciais e mercadológicas próprias dos veículos de imprensa não oficiais”.

Além disso, defendem que haveria o desrespeito à segurança jurídica, uma vez que “a publicação tanto em vias oficiais quanto em jornais de grande circulação representa o acesso à informação em sua forma mais segura, garantindo, assim, a transparência necessária para garantir a observância ao primado da segurança jurídica, a partir da manutenção da confiabilidade da informação”.

Assim, requereram a medida cautelar a fim de sustar os efeitos da norma modificadora da LSA até a análise exauriente da ADI, bem como pugnaram pela declaração da inconstitucionalidade material no julgamento final do feito.

No dia 4 de novembro de 2021, a Procuradoria Geral da República emitiu parecer sobre a ADI proposta pela Abio, defendendo a adequação da norma ao princípio da publicidade, considerando que não foi extinta a obrigação de publicizar os atos, mas, pelo contrário, esta foi simplificada, modernizada e desburocratizada.

Por outro lado, a PGR seguiu o mesmo entendimento da Abio em relação à garantia da segurança jurídica, argumentando que “a publicação da íntegra dos atos no diário oficial, conquanto mais onerosa para as sociedades anônimas, confere às informações divulgadas presunção de conhecimento e fé pública, além de conferir aos dados veiculados perenidade e maior credibilidade e segurança jurídica”.

Com isso, baseando-se em procedimentos já existentes no ordenamento jurídico pátrio e buscando manter a finalidade facilitadora e desburocatrizadora, propôs que os atos e as demonstrações publicadas no jornal de grande circulação, nas modalidades impressa e eletrônica, sejam arquivadas na junta comercial, com fundamento no artigo 2º da Instrução Normativa Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (Drei) nº 82/2021.

Em recente decisão (04/04/2022), a ministra relatora Cármen Lúcia denegou seguimento à ADI em razão da ilegitimidade ativa da parte autora, porquanto o rol estabelecido no artigo 103 da Constituição Federal não abrangeria a entidade proponente da ação.

Assim, prima facie, as modificações introduzidas pela Lei nº 13.818/2019 na Lei das Sociedades Anônimas continuam vigentes e gerando uma importante facilitação dentro desse segmento e contribuindo para o desenvolvimento da atividade econômica e laboral no país.


[1] CAMPINHO, Sérgio. Curso de direito comercial – sociedade anônima. 5ª ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. [E-book]. p. 450.

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